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O Recife Arretado: a luta por um sonho de feliCIDADE

Por Ivan Moraes, vereador do Recife (PSOL)

· Cartas à Queridagem

Recife, 16 de julho de 2020

Querida Queridagem,

Quero hoje dividir com vocês uma alegria e um desafio. No próximo dia 22 de julho, quarta-feira que vem, estaremos lançando o Recife Arretado. Uma série de diagnósticos sobre todas as áreas da política pública e 50 diretrizes para que a gente possa construir a cidade possível dos nossos sonhos. Uma cidade que cuida de suas pessoas, que é democrática, que respeita as diferenças, que vive em harmonia com o meio ambiente, que possibilita arranjos produtivos sem que haja exploração das pessoas ou da natureza. Um sonho de cidade que garante a liberdade de expressão pra todo mundo e a valorização de nossa cultura.

Nossas propostas são fruto de um amplo processo capitaneado pelo PSOL e pela Fundação Marielle Franco e Lauro Campos, com a participação de dezenas de organizações e milhares de pessoas. Será nosso ponto de partida para todo o processo de construção de programas nas eleições desse ano, seja para a chapa proporcional, seja para a majoritária.

Dá pra ler tudinho nesse link aqui, mas temos ainda a missão de transformar o documento em diversos produtos pra que ninguém deixe de conhecer o que queremos.

Essa caminhada começa com um monte de perguntas que a gente repetiu um monte de vezes desde que começou a conhecer, por dentro, a forma como se faz política na cidade. A cada movimento equivocado da prefeitura, elas gritavam ainda mais. “E se a gente estivesse no poder?”. “E se coubesse a nós estas escolhas?” “Se fosse nossa tarefa de elaborar o orçamento público e definir as prioridades da gestão?”. Sim, porque a gente tava ficando muito bom em criticar. E não era tão difícil.

A cada sessão, a cada votação, apontamos equívocos e denunciamos irregularidades na prefeitura comandada pelo PSB. Ao longo de suas gestões municipal e estadual, o partido, que até tem “socialista” no nome, distanciou-se das bases populares e assumiu compromissos com setores mais conservadores e poderosos da sociedade.

No poder, o grupo de Geraldo Júlio escolheu não universalizar a saúde básica, ignorou completamente as políticas culturais e gasta mal na educação. Além disso, torra milhões todos os anos com propaganda da gestão enquanto a comunicação pública só engatinha.

Mas e “a gente”? E essa turma toda que está no partido e por todo canto na nossa cidade?

As pessoas que a gente vê sempre nos protestos, nas organizações sociais, nas audiências públicas, nos conselhos, nas conferências, na academia? Se fosse da “nossa turma” a responsabilidade de tomar as mesmas decisões, de que forma a gente faria? Essas perguntas, repetidas e carinhosamente cobradas pelo Conselho Político do nosso mandato, mereciam um encaminhamento potente.

Levamos a discussão do conselho para as instâncias internas do PSOL e assim deu-se o ponto de partida do Recife Arretado. Chancelado pelas executivas municipal e estadual, o processo teve início reunindo dezenas de pessoas e organizações que participam das lutas do dia-a-dia da nossa cidade. Gente que sente na pele as desigualdades históricas do Recife. Gente que se debruça sobre os problemas do município, que estuda e propõe mudanças. Gente que não aguentava mais ser silenciada por quem está no poder.

De agosto de 2019 até março desse ano, a proposta ganhou vida. Através de urnas espalhadas por todos os lados, enquetes presenciais e online, entrevistas com especialistas em diversas áreas, ‘encontrões’ potentes de troca e construção. Nosso sonho de cidade, fruto de um desejo de mudança de prioridades e da forma de se fazer política, nasce justamente na hora em que mais precisamos discutir com seriedade o que queremos que seja nossa gestão pública municipal.

Durante todos esses meses de construção dessa proposta, acompanhei de perto as movimentações internas do PSOL nas discussões sobre como nos portaríamos nessas eleições de 2020. Enquanto nas atividades do Recife Arretado todas as diversas correntes internas que compõem o partido se uniam para sonhar a cidade, nas instâncias partidárias não havia consenso sobre como este sonho seria defendido nas urnas.

Vi nascerem neste período pré-candidaturas de companheiros queridos. A de Paulo Rubem, político em quem votei tantas vezes e que sempre foi referência minha como parlamentar competente e honesto. A de Severino Alves, liderança que conheci à frente do MTST e do Sindicato do Comércio Informal no Recife e que foi meu colega de chapa em 2016, figura fundamental para a conquista do nosso mandato. Por pouco tempo, também esteve pré-candidato Zé Gomes, um dos fundadores do partido, velho companheiro de arquibancadas do Sport e a quem muitas vezes me refiro quando quero entender melhor o funcionamento do PSOL.

Algumas vezes fui perguntado se meu desejo era que eu mesmo encabeçasse a chapa. Tantas vezes respondi que não era, pelo mesmo motivo pelo qual não assinei nenhum apoiamento a nenhuma das candidaturas até então postas.

Tenho (como tinha) confiança na competência de cada um dos postulantes – para quem estava disposto a fazer campanha com o mesmo vigor que defendi Dani Portela, nossa candidata a governadora em 2018, que ocupou a vaga que eu postulava e que hoje estará ao meu lado na chapa proporcional. Mas eu e as pessoas que constroem política comigo, em especial no coletivo Agora é Com a Gente, avaliávamos que Recife precisava de uma novidade grande, como foram as Juntas CoDeputadas em 2018. Uma candidatura feminista, de preferência representada por uma pessoa negra. Melhor ainda se viesse dos movimentos sociais, das ruas.

Me inspirava na chapa Boulos-Sonia em 2018 e acreditava que teríamos condições de trazer algo do tipo para o Recife. Estive presente em praticamente todas as reuniões do diretório municipal nos últimos anos, especialmente nos últimos meses. Reuniões muitas vezes duras, muitas vezes dificultadas pela impossibilidade de nos olharmos nos olhos. Minha posição seguiu a mesma linha: construir um sonho de cidade, montar uma chapa proporcional forte, paritária de gênero e raça, buscar no diálogo um consenso sobre uma candidatura que teria vontade e condições de levar adiante nossos acúmulos de tantos anos, agora sistematizados num documento como há muito não se via.

Ao mesmo tempo, com o crescimento da popularidade e iminente consolidação da candidatura de Marília Arraes à prefeitura, pelo Partido dos Trabalhadores, vi crescer no interior do PSOL, em especial entre o grupo político que tem ligeira maioria nos diretórios municipal e estadual, o desejo pela criação de uma frente junto à candidatura petista e outras legendas do campo das esquerdas.

Embora veja com bons olhos estes diálogos (falei nisso em outra carta), sempre achei que esta construção precisaria estar atrelada a um compromisso programático independente da tática eleitoral a ser definida. Recentemente o diretório municipal reuniu-se e definiu por uma aliança com o PT. A decisão foi apertada: 4x3. Em seus votos, as pessoas que integram o diretório refletiram a correlação de forças no partido, que segue os resultados do nosso último congresso, realizado em 2017.

Uma coisa que eu aprendi no PSOL: aqui, os votos do diretório quase nunca são individuais. Eles representam consensos das correntes que, a cada três anos, disputam o partido. Neste formato há margem para uma série de críticas e possíveis mudanças sobre as quais pretendo falar em cartas mais adiante.

Nos 15 anos em que militei na sociedade civil, por exemplo, a gente quase nunca votava. Mas não dá pra dizer que não houve democracia interna nem espaço para o contraditório. Em 2021, inclusive, haverá mais um congresso partidário, espaço para que filiadas e filiados se posicionem, mantendo ou modificando a forma de governança do partido, inclusive a correlação de forças que hoje nos dirige.

Conheço Marília da Câmara do Recife e, nos dois anos em que estivemos juntos na legislatura, a vi conquistando espaços e sempre se posicionando com veemência na oposição ao PSB, partido de onde veio de onde se afastou ainda em 2014. No Congresso Nacional, acompanho sua correta atuação ao lado do povo, contra o bolsonarismo.

Aceitando a definição do nosso diretório, reafirmo agora que não chegaremos com as mãos vazias. Trazemos conosco uma proposta linda, de uma cidade arretada, que queremos ver defendida na campanha.

E, com a gente, tem uma turma muito grande que faz muita questão disso.

Ivan Moraes
Vereador do Recife

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